Fonte: Jornal Gazeta do povo
Por: Camille Bropp Cardoso
Como lidar com o ciúme virtual
Vasculhar tudo do parceiro na internet é cada vez mais comum entre os casais. Saiba como tratar a insegurança
Olhe à sua volta e perceberá algo impensável há 20 anos. Não é difícil achar relacionamentos amorosos – de ficadas a casamentos – que terminaram por causa de janelas de bate-papo ou um emoticon suspeito. A internet não inventou o ciúme, mas se tornou uma ferramenta poderosa para parceiros atrás de “provas” e para os inseguros, que confundem lealdade com controle.
O Facebook, por exemplo, já foi ligado a separações várias vezes nos últimos anos. Uma pesquisa de 2013, da Universidade do Missouri (EUA), concluiu que pessoas que navegam por mais de uma hora na rede social têm relações mais turbulentas. Faltam estudos no Brasil, mas os impactos se verificam na prática. Detetive particular em Curitiba, Juliana Carina Moreira diz que a internet triplicou a demanda pelo serviço e mudou o perfil da clientela: “Há oito anos, eram casados que viam mudanças no comportamento do parceiro. Hoje são até namorados que pegam papos e comentários suspeitos no Facebook e no WhatsApp”.
Segundo especialistas ouvidos pelo Viver Bem, é difícil tachar relacionamentos pelo grau de privacidade; há quem viva feliz tendo perfis conjuntos ou dividindo senhas. O problema é quando só um parceiro exige isso ou a situação faz o casal brigar sempre por bobagens. A internet não cria, mas é capaz de exacerbar um traço controlador antes sutil. E o outro parceiro, se não cria limites, entra na roda viva.
O psicólogo Thiago de Almeida, autor de Relacionamentos Amorosos: o Antes, o Durante… E o Depois, lembra ainda que as redes sociais aumentam a interferência sobre o relacionamento: “Sempre alguém vê algo, que pode ser sinal ou não de possível traição, e conta para os envolvidos”.
Exagero
Com isso, surgiram aplicativos e sites que incentivam o instinto de “stalkear” (perseguir). Eles criam redes de “informantes” ou monitoram a localização via celular, por exemplo — tudo pelas costas. Quando chega a esse ponto, melhor rever tudo, diz o psicólogo Ailton Amélio. “Quem engana o outro para controlá-lo precisa se tratar”, resume. Amélio lembra que traições podem ocorrer mesmo em relações boas e independem da rédea curta. Ou seja, o esforço é inútil e só mina a relação.
O psicólogo Pedro del Picchia avalia que, no futuro, quando o universo digital deixar de ser novidade, haverá uma maior “relativização” da interação on-line. “Com o tempo, avalio que as pessoas entenderão que uma certa conversa pela internet tem uma linguagem que é do momento, do meio. Hoje, mesmo quem tem 20 anos tem como modelo de relação a dos pais”, completa o especialista.
Depoimentos:
“Namoro uma garota que dava mostras de ser ciumenta e ficou pior quando começou a mexer no meu celular e no meu computador. Achou conversas antigas e quase acabou tudo dizendo que não confiava em mim. Daí trocamos senhas, e eu acabei neurótico e fazendo o mesmo que ela. No fim, o nível de ciúme estava tão alto que nos separamos duas vezes. Estamos juntos de novo, mas não sei até onde vai. Quem quiser ficar comigo tem que me respeitar e confiar. Senão, não faz sentido.”
José*
28 anos, analista de sistemas.
“Sempre fui ciumenta porque namorei caras meio malandros. Quando conheci meu namorado, que tem um nível de fofice acima da média, pensava: não é possível, ele deve esconder algo. Pedi a senha do Facebook, nunca encontrava nada. A única coisa foram pesquisas que ele fez pelo nome da ex enquanto eu estava viajando, no réveillon. Briguei com ele, que chorou e se disse arrependido. Relevei e não falo mais sobre isso. Como nunca acho nada, me sinto meio mal, mas pelo menos diminui a frequência.”
Isabel*
20 anos, estudante.
* Nomes fictícios para preservar os entrevistados.
“Tive um namorado que gostava de comentar perfis de moças e eu descobria tudo. Notei que a internet me deixou mais ciumenta. Antes eu só desconfiava, mas a web confirma. Pedi as senhas dele. Era tão doente que se ele ‘logava’, ficava vidrada em cada ação. Bati boca com mulheres porque, cega, achava que os outros eram o problema. Hoje nem adicionei meu atual namorado no Facebook, apesar de fuçar a timeline dele às vezes. Aprendi que um certo individualismo deve existir.”
Sol Carvalho, 28 anos, bibliotecária e blogueira
Segure as pontas
A consultora amorosa Luiza Costa, do blog Pergunte a Uma Mulher, dá dicas politicamente incorretas aos ciumentos virtuais:
1) Nunca troque senhas
Isso só fará você perder tempo fuçando a vida do outro em vez de cuidar da sua própria. As horas na internet poderiam ser mais bem gastas na academia, lendo ou “até comendo pizza”.2) Ex
Não fique tão preocupado se o parceiro ou parceira ainda olha o perfil do ou da ex. “Eu mesma olho, mais por curiosidade sobre familiares dele que conheci e de que gosto”, conta a Luiza.3) Celular
Ser “não-me-toque” com o celular é complicado. “É polêmico. Mas lembre-se de que mexer no aparelho sem autorização é crime e pode dar ao outro argumento para ficar por cima, mesmo que seja pego no pulo”.4) Daí não dá
Adotar subterfúgios para controlar o parceiro sem ele saber é indício de que a coisa vai mal. “Criar perfil falso para saber se o parceiro dá bola, usar aplicativo de localização… são vários os níveis de loucura. Melhor mudar o namorado ou você mesmo”.